Remexendo no passado – Regra Gaúcha
Sei que o assunto vai levantar
opiniões contrárias, mas devo esclarecer a todos que eu vivi esses momentos e
por isso falo abertamente sobre essa regra pioneira. Caxias do Sul iniciou a
prática do futebol de mesa nessa regra, no ano de 1963. Nossas mesas foram
adquiridas junto ao Lenine Macedo de Souza e estavam espalhadas em diversas
agremiações. Com o tempo fomos construindo outras, nas mesmas medidas, mas
feitas de pau marfim. Todos os botões utilizados eram puxadores, embora a AABB
tenha adquirido dois times da marca Lione, os quais ficavam depositados no
departamento à disposição daqueles que não tinham time para jogar.
Desde esse ano tentávamos jogar o
campeonato estadual que era realizado sempre em Porto Alegre. Depois de dois
anos de negativas fomos informados que necessitaríamos criar uma entidade que
reunisse todos os clubes praticantes do futebol de mesa de Caxias. Foi então
que, em 1965, foi fundada a Liga Caxiense de Futebol de Mesa.
Ao final do ano partimos para
Porto Alegre, ladeando nosso campeão: Deodatto Maggi. Viajamos de ônibus,
acompanhando e torcendo pelo nosso representante, juntamente com o amigo Sérgio
Calegari. Da Rodoviária nos dirigimos à sede do clube “Piratas”, onde nos
esperava Paulo Borges, campeão porto-alegrense. Chovia a cântaros e ficamos
decepcionados com a falta de quorum. Éramos quatro pessoas no recinto, três
caxienses e um porto-alegrense. Mas, como chovia atribuímos a isso a falta de
assistência. O campeonato estadual foi realizado em uma única partida, na mesa
de propriedade do próprio Paulo Borges, que acabou vencendo-a. Isso chamou a
nossa atenção para a falta de comunicação da Federação com os seus filiados.
Com isso procuramos conhecer a história dos estaduais gaúchos.
Consultando jornais antigos
(Folha da Tarde Esportiva, Folha da Tarde e Última Hora) do ano de 1962,
tomamos conhecimento que os participantes daquele campeonato eram de Porto
Alegre (Lenine Souza, Milton Mendonça, Silvio Bareta, Celso Plentz, Sidney
Pardo, Túlio Casapicola representando diversas entidades), Rio Grande (Waldir
Ferreira, Clair Marques, Jorge Alal, da Estrela Vermelha) e Santa Maria (Doutor
João Adalberto Soares Behr e Eli Figueira).
Depois disso procuramos nos
inteirar sobre o desenrolar dos campeonatos gaúchos, que afinal era a única
promoção da Federação Riograndense de Futebol de Mesa, e ficamos sabendo que de
1962 até aquela data somente botonistas da capital o haviam vencido. As outras
promoções que conhecíamos foram realizadas na cidade de Caxias: Torneio de
Inauguração da LCFM e o Torneio de Primeiro Aniversário.
No ano de 1966, a Federação era
presidida por Gilberto Ghizi, e esse por ter participado dos torneios acima
mencionados, nos solicitou que promovêssemos o Campeonato Estadual. Aceitamos,
com a condição de podermos fazer os convites para as demais agremiações. E,
assim, participaram do campeonato as cidades de Porto Alegre, Rio Grande,
Arroio Grande, Rosário do Sul, São Leopoldo e Caxias do Sul.
O campeão desse ano foi Carlos
Saraiva, que representava o Internacional. Na noite anterior ao início do
certame foi apresentado o anteprojeto da Regra Nacional, que seria apresentada
na Bahia no mês seguinte, e que deu origem à nossa Regra Brasileira. Estiveram
presentes Paulo Borges, Carlos Saraiva, Sérgio Duro, Fausto Borges, Clair
Marques, além de Gilberto Ghizi e este que escreve essa crônica.
A intenção era a de promover o
esporte, realizar campeonatos a nível nacional, conseguir juntar os botonistas
de todo o país em torno de uma idéia de unificação, o que infelizmente jamais
será conseguido em virtude da diversidade de regras disputadas. O resultado
desse trabalho esbarrou em interesses comerciais que envolviam o senhor Lenine
Macedo de Souza, proprietário da empresa que fabricava botões Lione, bolinhas,
mesas e goleiras. Essa foi a razão da desunião que gerou praticamente uma
guerra de botonistas porto-alegrenses contra os caxienses. A idéia que saiu
vencedora foi a da nova regra, visto que iniciamos a participar de torneios e
campeonatos em diversos pontos do país, desde então.
Campeões gaúchos na
Regra Gaúcha
Em janeiro de 2010, recebi do
amigo Edú Caxias a relação de campeões da Regra Gaúcha que lograram escrever
seu nome no rol dos grandes vencedores:
1962 – Lenine Macedo de Souza
1963 – José Androvani
1964 – Paulo Borges
1965 – Paulo Borges
1966 – Carlos Saraiva
1967 – Clair Marques/ Enio Vogues
1968 – Sérgio Duro
1969 – Jorge Mello
1970 – Julio Cantori
1971 – Antonio Azevedo
1972 – Claudio Schemes
1973 – Pedro Cruz
1974 – Pedro Cruz
De 1975 até 1996 não foram
localizados registros da realização de Campeonatos Estaduais da Regra Gaúcha,
levando a crer que não ocorreram.
1997 – Clóvis Pavão
1998 – Vinicius Bueno
1999 – Clademir Brazeiro
2000 – Jefferson Riffel (Cabelo)
2001 – Josias Guedes
2002 – Vinicius Bueno
2003 – Ricardo Bernardes
2004 –Eduardo Orci
2005 – Eduardo Orci
2006 – Eduardo Orci
2007 – Julio Costa
2008 – Vinicius Bueno
2009 – Thiago Leão
Indiscutivelmente a Regra Gaúcha,
que também é mãe da Regra Brasileira, foi beneficiada com a criação desta, pois
de uma única promoção dos primeiros anos, passou a contar com um calendário
amplo, como: Aniversário de Porto Alegre, Copa Farroupilha (Santa Maria), Copa
Amizade (Charqueadas), Copa Rio Grande do Sul – (União - Porto Alegre) e tantas
outras realizações que deram um alento no engrandecimento dessa bonita
modalidade de jogo. O grande impulso verificou-se com a adesão do Bazar Mimo,
que nos anos noventa assume e realiza campeonatos concorridos e mais amplos,
culminando com a fundação da Liga Gaucha, a qual coordena desde então.
Antes de 1970, o Rio
Grande do Sul tentou promover um Campeonato Brasileiro
Os jornais antigos não deixam de
cumprir sua missão. A Folha Esportiva, de dezembro de 1962, publicou e eu
reproduzo integralmente: Gaúchos
sozinhos no Brasileiro de Football de Mesa.
A Federação Rio Grandense de
Football de Mesa tinha marcado para amanhã, na sede do Aeroclube do Rio Grande
do Sul, av. Borges de Medeiros, 901, com início às 14 horas, o primeiro certame
nacional do referido esporte. Mas, como a Federação Paulista informou por
telegrama que não se fará representar e como a Federação Mineira até o momento
de encerrarmos o nosso expediente não havia mandado confirmação da participação
dos seus representantes, a FRGFM fará, na tarde de amanhã, apenas um torneio de
encerramento do ano esportivo, com a participação dos disputantes do campeonato
estadual, efetuado domingo último, e, às 18 horas procederá à entrega dos
prêmios do certame brasileiro, aos vencedores do estadual, uma vez que os
outros estados, por falta de comparecimento perderão por WO.
A FRGFM convoca, por nosso
intermédio, os representantes do interior, que possam comparecer novamente na
Capital, amanhã, a fim de receberem os títulos de campeões brasileiros e
disputarem, durante a tarde, o torneio de despedida do ano de 1962.
Os prêmios ofertados para o
certame brasileiro o foram exclusivamente pela Metalúrgica Abramo Eberle, de
Caxias do Sul, além das bolsas de estudos no Instituto de Idiomas Yazigi.
Nesta oportunidade, o presidente
Lenine Macedo de Souza fará a sua despedida do football de mesa, uma vez que
somente voltará a participar de certames quando não mais for presidente da
mater do botão.
Um depoimento
importante de um campeão gaúcho
Clair Marques, campeão em 1967,
juntamente com Ênio Voges, publicado no Blog da AFUMECA – Associação de Futebol
de Mesa de Cascavel, reportou-se à forma impositiva do presidente Lenine Macedo
de Souza no tocante a utilização dos botões:
“Nesse campeonato em que terminamos empatados em pontos, eu e o Ênio
Voges fomos declarados campeões. Foi um campeonato estadual realizado em Rio
Grande, no Esporte Clube União Fabril, clube que ficava localizado em frente ao
portão lateral do cemitério de Rio
Grande e já não existe mais. Eu estava na minha casa, já achando que o Lenine e
os seus convidados não viriam mais, quando escutei o som de fogos de
artifícios. Fui olhar no portão e estavam se dirigindo para a minha casa, num
comboio de cinco ou seis carros e uma Kombi, com bandeiras da FRGFM e cartazes
alusivos ao Campeonato Estadual de Futebol de Mesa, que seria disputado na
cidade. Juntamos o pessoal de Rio Grande, demais convidados e começamos a disputa do estadual. A finalidade
maior desse campeonato estadual, descobri posteriormente, era promover os novos
botões plásticos “LIONE” da fábrica de Lenine Macedo de Souza. Cada
participante do campeonato tinha que retirar cinco dos botões de galalite de
seu time e, obrigatoriamente, incluir no seu time cinco botões da marca
“LIONE”. Esse detalhe o Lenine não tinha comunicado a ninguém de Rio Grande”.
(Clair Marques).
Conforme é salientado no mesmo
Blog: Lenine, numa atitude de desespero, chegou a obrigar os técnicos das
associações filiadas à Federação Riograndense de Futebol de Mesa, a utilizarem
50% de botões LIONE em seus times, em competições oficiais. Esta atitude abalou
a relação de Lenine com a grande maioria dos botonistas filiados. Com a sua
transferência para o Paraná, nos anos seguintes a fábrica foi desativada e a
FRGFM teve continuidade com outros presidentes, que revogaram a clausula que
obrigava a utilização dos botões LIONE.
São fatos que aconteceram, mas
jamais poderá ser contestado o pioneirismo de Lenine Macedo de Souza, no
tocante a fundação da primeira Federação de Futebol de Mesa do país. Pena, foi
a sua intransigência no sentido de uma união entre botonistas, persistindo
sempre com a sua idéia original de a Regra Gaúcha ser reconhecida
nacionalmente. Até hoje, não há unanimidade entre os que a praticam, pois dele
já surgiram variantes que provocaram rupturas entre botonistas
porto-alegrenses.