MEUS PRIMEIROS PASSOS NO FUTEBOL DE MESA
Esse trecho foi escrito há muito
tempo. Talvez tenha sido um dos primeiros escritos que realizei e ao
descobri-lo, junto com outros papéis, resolvi trazer aos amigos, pois mostra a grande
caminhada realizada para chegar até onde consegui nesse esporte que tanto amo.
Era uma tarde ensolarada de
primavera, no ano de 1947. Não recordo o dia da semana, nem mesmo o mês, mas
apenas o convite: - Vamos assistir ao campeonato de futebol de botão, na casa
do Marco Antonio Vianna?
Nunca ouvira falar de futebol de
botão. Muito menos em campeonato de botão. Aceitei o convite e juntamente com
Jaudir Canalli e Nelson Miranda segui até a casa do Marco Antonio. Sua
residência distava uns quatrocentos metros da minha. Mas, o que estava distante
é o que era o campeonato de botão?
Chegando à casa do Marco Antonio
deparei-me com uma porção de gente conhecida, todos com suas caixinhas debaixo
dos braços. Solon Picolli Coelho, Emyr Zugno, Renato Toni, entre tantos outros
eram os mais fanáticos, além do dono da casa, naturalmente. Este era o
proprietário do magnífico estádio do Ypiranga, time que ostentava uma camisa
listrada branca e preta, desenhada pelo próprio Marco Antonio e que servia de
ornamentação à sala de jogos. Marco Antonio, meu colega de sala de aula, e que se
sentava ao meu lado, mostrou-me uma grande caixa cheia de craques. E o detalhe
importante para mim, deslumbrado naquele mundo novo que surgia aos meus olhos,
é que todos os botões tinham seu próprio nome. Dizia-me, o anfitrião: - Tenho
dificuldade em escalar meu time, pois tenho muitos jogadores em condições de
serem titulares.
Sentei-me em cima de uma mesinha,
em um canto e fiquei assistindo, embevecido, todas as partidas daquela rodada,
sem imaginar que daquele momento em diante estava contaminado pelo vírus do
futebol de mesa.
Ao regressar a casa, quase noite,
escutei uma reprimenda de minha mãezinha, que como sempre, queria que eu
ficasse em casa estudando> O jantar estava pronto. Após o jantar, todos
foram para sala para a diversão daquela época: escutar rádio. Eu,
sorrateiramente, fui ao quarto de meu avô que morava conosco e tinha bons
ternos. Fiz uma limpa nos melhores e maiores botões, tirando-os com uma gilete,
e dessa maneira consegui contratar a minha primeira equipe. Lembro ainda de
dois zagueiros, vindos de uma gabardine, que por muitos anos foram titulares do
Vasco da Gama, o time que ganhava tudo naquela época.
Nossa casa era simples e na parte
superior um sótão. Lá, meu pai colocara uma mesa de cozinha, substituída por
uma nova que ele havia adquirido. Examinando-a cheguei à conclusão que ali
seria construído o Estádio de São Januário. Com a devida autorização, marquei o
campo, limpo como nenhum outro na cidade, depois de várias lixadas. Num dos
cantos havia uma falha na madeira, mas caso o botão ali chegasse, poderia ser
ultrapassado com a ajuda do árbitro, que o colocaria onde pudesse jogar. Para
as metas usei pregos grandes, aos quais amarrei um arame grosso, dando um
formato de balizas que eu tanto via nos campos do Flamengo, Juventude e
Fluminense. A rede foi um grande pedaço de filó que minha mãe me deu. Para
colar usei sabão. Esquentava o sabão e juntava as duas partes do filó e os
grudava com o sabão amolecido. Endurecia e não descolava mais. Tudo muito bem
cuidado.
Jogamos muito nesta mesa.
Passávamos tardes, após as aulas disputando partidas sérias e inspiradas.
Realizávamos campeonatos espetaculares para as crianças que éramos na época.
Tínhamos até estatística para saber quem era o goleador do campeonato. Na nossa
rua o futebol de botão ganhava adeptos que participavam ativamente: Renato
Toni, Vasco Alceu Balem, Mansueto de Castro Serafini Filho (atual Prefeito de
Caxias do Sul), Sérgio Gobetti (que viria a falecer num acidente
automobilístico), Luiz Felipe Kunz Neto, Lyon Kunz, Ítalo Bazzo, Vilson Tomazzi
e o Reni Toni (irmão do Renato) que por ser muito pequeno sempre carregava um
banquinho para alcançar a mesa. Na nossa rua veio morar o senhor Fúlvio
Barbosa, pai do Marcos Fúlvio de Lucena Barbosa, grande botonista que hoje
reside no Rio de Janeiro. Mas nós não deixávamos jogar por ser muito pequeno.
Não havia troféu a ser disputado, pois além de serem caros, eram raros e nosso
dinheirinho era destinado à compra de craques. Improvisávamos troféus com papel
dourado, mas o vento os carregava, pois em muitos locais jogávamos na rua
mesmo, ou então nos pátios das casas.
Isso sempre trazia novos convites
e amigos de outros locais. Nos domingos, pela manhã, saiamos sempre em dois ou
três para jogar nossos amistosos. Ali perto funcionava o escritório do senhor
Máximo Luz, pai de nosso colega Telmo, onde na ausência do Senhor Máximo íamos
jogar. José Roque Aloise era filho de um alfaiate e morava na Julio de
Castilhos. No domingo o pai ia para a missa e nós ficávamos jogando na
alfaiataria. Vanderlei Prado morava no bairro de São Pelegrino e para lá nos
deslocávamos frequentemente. Outro que visitávamos sempre era o Rui
Pratavieira, em cujo porão mantinha uma excelente mesa.
O Renato era um exímio fabricante
de botões e goleiros. Tinha uma habilidade tremenda para lixar e deixar os
botões de forma a serem cobiçados por todos. O goleiro os fazia de madeira e
numa oficina de chapeação, defronte ao mercado de seu pai, os pintava em cores
diversas.
Foi então que começaram a
aparecer botões diferentes. Os mais afortunados ganhavam times vindos do Rio de
Janeiro, outros de Porto Alegre, padronizados com distintivos dos clubes. Os
mais pobres, como eu, ficávamos na expectativa da troca por um dos craques
goleadores que possuíamos, pois tínhamos sempre o cuidado de conservá-los bem
lixados e lustrados.
Foi então que, após alguns anos,
ficamos sabendo que na Vila Scharlau, em Porto Alegre, mais precisamente na Rua
Paulino Teixeira 51, havia uma fábrica de botões puxadores. Como eu tinha tios
que moravam em Porto Alegre, sempre pedia que conseguissem para mim, mas em
vão, pois eram solteiros e namoradores. Não tinham tempo para se deslocarem até
a Vila Scharlau e gastarem seu dinheiro restrito em botões.
Os botões eram de uma cor, de
duas ou de três cores. O que valia para cada um de nós era poder comprar, não
importando que quem jogasse com o Grêmio tivesse alguns botões vermelhos,
verdes ou marrons, assim como os colorados orgulhavam-se de possuir entre os
seus craques botões azuis, pretos, amarelos. Valia tudo para ser feliz.
Pena que ninguém, um pouco mais
velho do que nós, se interessasse e organizasse um campeonato, com disputa de
troféus, para que aqueles meninos pudessem lutar para conquistá-lo.
Isso continuou até 1962,
aparecendo muitos botonistas que marcavam época e criavam escola. Muitos
redutos foram aparecendo, sem nenhum cunho oficial e sempre com uma ponta de
temeridade, pois ninguém queria que outras pessoas soubessem que se jogava
botões. Era esse um jogo para crianças.
Com a criação da Federação
Riograndense de Futebol de Mesa, graças ao trabalho de um idealista de Porto
Alegre (Lenine Macedo de Souza), a desinibição começou a agitar alguns
botonistas caxienses, criando-se departamentos de futebol de mesa no Recreio
Guarany, na AABB, no Grêmio Banrisul. E neles foram se encontrando velhos
botonistas infantis, agora adultos, para campeonatos memoráveis. Lembro que
meus colegas Marcos Pedro Amoretti Lisboa, Delesson Pavão Orengo, Sylvio
Puccinelli, Justo Martins, Carlos Bertelli, Jovir Zambenedetti, Edgar Panosso,
Renato M. Muller, Antonio Carlos de Oliveira, funcionários do Banrisul
praticavam o futebol de mesa sem constrangimento. Em 1963, já no Banco do
Brasil, encontrei Raymundo Antonio Rotta Vasques, Sérgio Calegari, Paulo Luís
Duarte Fabião, Ivan Mantovani, Nelson Mazzochi, Sergio Guimarães da Silva, Luiz
Carlos Carlucci de Campos, Roberto Cagliari Grazziotin, Rubem Bergmann, José
Fiorindo Angeli, Luiz Carlos Ponzi, Homero Kraemer de Abreu e Carlos Perez e
passamos a disputar campeonatos. Unidos, resolvemos realizar o campeonato
bancário de Caxias e então apareceram os colegas Dauro Brandão de Mello (Banco
Nacional do Comércio), Pedro Massignani (Banco Sul-Brasileiro), Francisco Rebstein
(Banco Nacional do Comércio), Flávio Chaves (Banco Nacional do Comércio) e José
Regis de Carvalho Prestes (Banco da Província) sendo incorporados e realizando
grandes campeonatos.
Já nessa época a Livraria
Saldanha negociava e tinha grande quantidade de botões avulsos para a venda aos
interessados. Foi à época em que o futebol de mesa movimentou a cidade e
recebemos o apoio da mídia, através do Jornal “O Pioneiro” e das Rádios Caxias
e Difusora. Na AABB a revista editada sempre mantinha colunas sobre o futebol
de mesa e plagiando a Revista do Rádio que tinha uma página de fofocas, o
colega Vicente Sacco Neto, além de escrever uma coluna contando tudo sobre o
esporte, criou uma página de fofocas, onde dizia que o quarto do Calegari
estava todo rabiscado com táticas de jogo, que o Puccinelli e o Sambaquy se
visitavam para elogiar suas galerias de troféus, que o Vasques atribuía a
magnífica forma de seu centro avante Cardeal a banhos de imersão em geléia
real, que o Mazzochi e o Vasques estavam mancomunados para deixarem a
lanterninha do certame ao Homero Abreu, e assim por diante. Era leitura
obrigatória.
Acredito que esse texto tenha
mais de vinte anos. Não posso precisar a data, mas, foi escrito com maquina de
datilografia e há mais de vinte anos eu não as uso mais.
UMA FOTO DO PESSOAL
QUE PRATICAVA O FUTEBOL DE MESA EM BRUSQUE
A turma do futebol de mesa também
praticava futebol de salão e de campo. A foto que reuniu os botonistas
brusquenses em um jogo contra um dos quadros do Santos Dumont, dá uma amostra
de quem eram os brusquenses citados no Bate Bola anterior.
De pé, da esquerda para a
direita: Marinho Vieira (Vascão), Edson Gartner (Zebra), Sérgio Walendowsky
(Vasco da Gama), Sérgio Moresco (Independiente), Valmir Merísio (Juventus),
Antonio (Nico) Cunha (Marujo) e Mário Muller (Fluzão).
Agachados: Marco (Brusque), Oscar
Bernardi (Botafogo), Adauto Sambaquy (Internacional), Agostinho Boing
(Flumesa), Roberto Zen (São Paulo) e Décio Belli (Guarany)
Deitados: Valter Zen (Fluminense)
e José Ari Merico (América).
Vários deles foram jogadores
titulares dos dois times da cidade: Carlos Renaux e Paysandú.
Até o próximo Bate Bola.
Um comentário:
LH.ROZA
Parabéns meu amigo "AC.Sambaquy", pois mais uma bela narrativa.,
Esperar pela sua próxima "coluna" é saber que sempre iremos aprender algo mais.
Até + e uma forte abç.
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